9 de ago. de 2011

Mini Curso - Prof. Francisco Petrônio Peres Lima

Mine Curso: III Simpósio de Ipu
CULTURA SOCIAL E “TRABALHO” NAS NARRATIVAS DA CIDADE
Prof. Francisco Petrônio Peres Lima
Historiografia, Cultura e Trabalho.
Em nosso mine-curso buscaremos desenvolver algumas reflexões historiográficas e metodológicas na perspectiva da história cultural sobre as narrativas urbanas e rurais. Tem como objetivo central analisar representações e práticas culturais em temáticas localizadas em espaços e temporalidades diferenciadas, levando em consideração as narrativas construídas sobre o mundo social do trabalho; a organização dos discursos e suas disputas políticas e simbólicas nos espaços do cotidiano. O que não difere ao estudo das linguagens, da literatura, das artes, das idéias filosóficas e políticas, dos sistemas religiosos como práticas de significação históricas e culturais do pensar cearense que tratam da organização de atividades, instituições e relações em diferentes momentos históricos e historiográficos dos valores e narrativas.
OBJETIVO: fazer uma reflexão política, historiográfica e metodológica sobre o universo da cultura social e seus “sujeitos históricos” em sua diversidade, enfocando os confrontos culturais e simbólicos presentes em diferentes espaços e práticas sociais do trabalho e suas narrativas, tendo então algumas referências de pesquisas já desenvolvidos sobre o tema.
EIXOS TEMÁTICOS: Quatro grandes eixos articulam o conjunto das discussões aqui mencionadas:
1-Enfatizar o conceito de cultura social na experiência das narrativas produzidas sobre os trabalhadores e “marginalizados” nos espaços do cotidiano.
2-Enfocar a "História Cultural", articulando abordagens da história e da antropologia desconstruindo os discursos de uma “cidade folclorizada” na historiografia oficial.
3-Volta-se especificamente para os intelectuais, em especial os literatos e “folcloristas” que pensaram, tematizaram e investigaram aquilo que definiam como "o popular" nas narrativas urbanas..
4-Toma como objeto as tradições festivas e coletivas das ruas, procurando múltiplos significados e reflexão sobre a “folclorização” da cultura popular no pensar cearense.
NARRATIVAS E POSSIBILIDADES: Toda narrativa é uma produção social e cultural de discursos produzidos: Sendo assim a narrativa é um ato político. Seu ato político é o de convencer pela fala, pelo ato da palavra... Não existe história se não houver narrativas...( Durval Muniz )

MEMÓRIAS E NARRATIVAS.A memória é uma expressão social de “fabricação” e reinvenção de discursos e representações culturais.
1. O QUE É CULTURA?: A Cultura de modo geral compõe os elementos sociais ligados as artes, ciências, costumes, sistemas, leis, religião, crenças, esportes, mitos, valores morais e éticos, comportamento, preferências, invenções e todas as maneiras de ser (sentir, pensar e agir). Porém seu sentido é bem mais abrangente, pois cultura pode ser considerada como tudo que o homem através da sua racionalidade, mais precisamente a inteligência, consegue executar, dessa forma todos os povos e sociedades possuem sua cultura por mais tradicional e arcaica que seja, pois todos os conhecimentos adquiridos são passados das gerações passadas para as futuras.

“A origem da nossa palavra “cultura” encontra-se na língua latina. O radical da palavra é o riquíssimo verbo latino colo, que tem o sentido original de “cultivar”. O vocábulo latino cultus (particípio de colo) tem, portanto, inicialmente o sentido de cultura da terra. O verbo assumiu o sentido de “cuidar de”, “tratar de”, “querer bem”, “ocupar-se de”, “adornar”, “enfeitar”. Depois o sentido de “civilização”, “educação”; e também o sentido de “adorno”, “moda”, “decoração”. Mais recentemente, os alemães tomaram a palavra “cultura” num sentido mais amplo, para referir-se ao cultivo de hábitos, interesses, língua e vida artística de uma nação. Atualmente, na língua portuguesa, talvez não exista nenhuma outra palavra com sentido mais abrangente do que a palavra “cultura”. Por cultura se entende muita coisa.”
A cultura é uma das principais características humanas, pois somente o homem tem a capacidade de desenvolver culturas, distinguindo-se dessa forma de outros seres como os vegetais e animais.
Apesar das evoluções pelas quais passa o mundo, a cultura tem a capacidade de se permanecer quase intacta, e são passadas aos descendentes como uma memória coletiva, lembrando que a cultura é um elemento social, impossível de se desenvolver individualmente.
A NOVA HISTÓRIA CULTURAL
“...uma história problematizadora do social, preocupada com as massas anônimas, seus modos de viver, sentir e pensar. Uma história com estruturas em movimento, com grande ênfase no mundo das condições de vida material, embora sem qualquer reconhecimento da determinância do econômico na totalidade social, à diferença da concepção marxista da história. Uma história não preocupada com a apologia de príncipes ou generais em feitos singulares, senão com a sociedade global, e com a reconstrução dos fatos em série passíveis de compreensão e explicação.” Vainfas (2002, p. 17):
“Quem é esse cavaleiro andante, em plena cidade contemporânea, a conduzir seu estandarte cheio de apliques, metendo-se pelos lugares, a levar sua palavra? De início, chega-nos sua estranheza, seu “deslocamento”, antes, até de sua gentileza. Vê-lo com sua bata branca pela rua é ter contato com uma figura que nos parece extemporânea. Não de um futuro, mas de uma voz que ecoa, bizarramente, um sagrado que não se mostra mais.” (Brasil Tempo de Gentileza” – Leonardo Guelman)

A Cultura Social na Análise Historiográfica: Com a chegada da História Cultural o conceito de Cultura Social passou então a ser redefinido e questionado sob a ótica dos historiadores sociais. Para alguns pesquisadores do assunto a categoria de cultura “popular” e “erudita” as diferentes definições sobre cultura popular podem ser divididas em dois grandes modelos:o que concebe como um sistema simbólico autônomo, e o que a percebe como dependente de referência a uma cultura dominante.

Roger Chartier e a Cultura Popular.
“A cultura popular é uma categoria erudita.” Assim defeniu Roger Chartier, ao enunciar, no começo de uma conferência, a sua fala. Em outras palavars o mesmo define:” Ela pretende somente relembrar que os debates em torno da própria definição de cultura popular foram (e são) travados a propósito de um conceito que quer delimitar, caracterizar e nomear práticas que nunca são designadas pelos seus atores como pertencendo à ‘cultura popular’”. Com base nos estudos de Chatier existe então uma categoria erudita destinada a circunscrever e descrever produções e condutas situadas fora da cultura erudita, o conceito de cultura popular tem traduzido, nas suas múltiplas e contraditórias acepções, as relações mantidas pelos intelectuais ocidentais com uma alteridade cultural ainda mais difícil de ser pensada que a dos mundos "exóticos".
Cultura Popular no Brasil:
Os estudos sobre folclore e cultura popular no Brasil se iniciam, na segunda metade do século XIX, sob os auspícios da construção de uma identidade nacional. É nessa trilha que se insinua o trabalho pioneiro de Sílvio Romero.
A idéia de Estado Nacional formulada durante um longo período na Europa, acabou por se definir no século XVIII como um poderoso elemento de coesão e de coerção social. Ele configurou-se como a expressão moderna oriunda da correlação de forças, que estavam em jogo naquele momento na Europa. Na idade média um homem se sentiria primeiramente cristão e só depois se diria francês, essa situação se inverte fazendo com que a nacionalidade ocupe o primeiro item de hierarquia de identidade e pertencimento, relegando a identidade religiosa a um segundo plano (Moreira,1999:312-313).

CAPISTRANO DE ABREU: UMA INTRODUÇÃO AOS NOVOS TEMAS E ABORDAGENS

O Historiador Cearense Capistrano de Abreu renovou os métodos de investigação e interpretação historiográfica no Brasil. De início baseou-se nos princípios de Comte, Taine, Buckle, Spencer, e afirmou-se adepto do determinismo sociológico, pretendendo com seus estudos descobrir "as leis fatais que regem a sociedade brasileira".
Realismo histórico
Mais tarde, com o trabalho na Biblioteca Nacional e com a leitura de pensadores alemães como Ranke, Bücher, Eduard Meyer, Sombart e Wundt, evoluiu do positivismo para o realismo histórico, e a pesquisa cuidadosa e imparcial das fontes conferiu às suas interpretações um caráter objetivo.
Sua análise da civilização brasileira parte do estudo do ambiente, dos fatores geográficos, raciais, econômicos e psicológicos. De acordo com o pensamento de Buckle, ressalta a influência das massas e do homem comum na evolução histórica e diminui a importância atribuída aos chefes ou heróis.
Capistrano exerceu grande influência sobre os historiadores de sua geração, sobretudo Rodolfo Garcia, Pandiá Calógeras, Afonso Taunay e Paulo Prado. Seu estilo reflete a economia e a objetividade de sua orientação técnica.
Sua obra mais importante é Capítulos de história colonial, 1500-1580, de grande poder de síntese e que lhe confirmou a superioridade como historiador aos recenseadores de fatos, nome e datas.

“...Capistrano de Abreu elaborou, portanto, uma história vista do sertão, contrapondo-a ao "sertão-problema" criado a partir da visão litorânea. Ao destacar, por exemplo, a importância do vaqueiro e do bandeirante no processo de integração territorial, ele ressalta o papel da livre iniciativa e apresenta o trabalho como valor - pois a participação do escravo nas atividades econômicas desenvolvidas no interior é minimizada. A valoração positiva do sertão propiciou-lhe lançar sobre o Brasil um olhar de "dentro" - ao invés de assumir o posicionamento tradicional que se centrava excessivamente sobre o litoral, ou seja, o ponto de vista de "fora", do português. Essa seria por um lado sua inovação em relação às concepções vigentes na historiografia nacional, e, por outro lado, sua contestação dos princípios ordenadores das disputas simbólicas pelo princípio de classificação e hierarquização do sertão em relação ao litoral. Com esse movimento heterodoxo no campo da historiografia, ele legitimou uma nova definição da divisão do mundo social ao contar uma história da sociedade civil, em que o "espírito de liberdade" sertanejo é preponderante na constituição da nação brasileira.”
AS FORMAS CULTURAIS DA CEARENSIDADE: A OCULTAÇÃO DO “OUTRO”
O sertão que costumamos ver nas xilogravuras cearense é o sertão produzido e reproduzido pelas narrativas e representações simbólicas do elemento formador da ambiência cultural nordestina: O trabalhador rural, o vaqueiro, o retirante, sempre carregado de figuras e formas imaginárias. Mas na realidade, por que mesmo os sujeitos marginalizados como os trabalhadores urbanos e rurais figuram somente na implementação dos discursos construídos sobre os espaços folclorizados? Como podemos entender as formas culturais de representação silenciada sobre o “outro”? Com base na Historia Cultural o não dito sobre o “outro” é produzido através das narrativas dominantes da história oficial.
O outro pode ser entendido como os sujeitos marginalizados quem não aparecem na produção do conhecimento locais e são muitos vezes citados de tabela como figuras exóticas nos livros dos “senhores do passado.” Como por exemplo, alguns sujeitos sociais como os bêbados, as prostitutas, loucos e andarilhos são vistos elementos de quinta categoria e não são assim considerados pela “dita melhor sociedade” produtores de cultura no meio social. Em se falando da Literatura o Ceará folclorizado do índio “bom selvagem” de Alencar teve um certo destaque na criação de entidades ligadas as artes e as letras como os Gabinetes de Leituras e os Centros Artísticos no inicio do século XX. Em Ipu a projeção do mito fundador Iracema se dar a partir do esforço de alguns intelectuais ligados ao Gabinete de Leitura (1919) em tentar construir uma narrativa ou uma identidade local através da literatura de Alencar. Isso é precebido na construção de praças e em nomes de pequenos e grandes estabelecimentos que até hoje é referência para pesquisadores locais e regionais.
Daí toda uma narrativa romanesca e historiográfica tradicional sobre os índios e a ocupação da terra pelo colonizador português. No entanto,o já citado historiador Capistrano de Abreu foi sem dúvida um dos primeiro a introduzir novos temas e abordagens na questão do “pensar cearense” de uma outra forma historográfica. O pensar para dentro de si mesmo, de olhar para interior do sertão e não somente para o litoral. Outra questão pertinente é forma que a história oficial ainda tenta negar que o Ceará “não houve escravidão negra”, o que de fato nos parece uma forma de produzir um discurso de branqueamento na esfera civilizatória e social do povo Ibiapabano. Muito embora, nós pesquisadores da História Cultural corremos o risco de também “folclorizar” alguns aspectos da produção histórica. No entanto, é relevante atribuir o papel social dos trabalhadores escravos e não escravos na produção do conhecimento narrativo das lendas e mitos e não somente atribuir o papel da culinária e danças tradicionais como única maneira de representar as formas culturais de um povo.
AS LENDAS RURAIS E URBANAS: UMA PRODUÇÂO SOCIAL DOS DISCURSOS NA CIDADE
“Resolvi lhe dizer uma só verdade...mas que verdade será esta? Não gastemos tempo, a verdade que vos digo é que no Maranhão não há verdade..( introdução da fala de um sujeito anônimo do Maranhão na música de Zeca Baleiro - A Serpente)
No Ceará, mais precisamente no começo do século XVIII a influencia das tradições orais africanas sofreram consideráveis modificações nos mitos, lendas e crenças do povo interiorano. Considerando o fato de que o trabalhador negro também contribui na formação de uma cultura popular rica e diversa em seu cotidiano. Suas expressões criativas adaptaram-se a beleza das velhas narrativas e crônicas do romanceiro português. Dos candomblés e senzalas foram às velhas amas-de-leite (akpalô) que preservaram a tradição oral dos cantos e lendas africanas no interior do nordeste brasileiro. É relevante atribuir aos trabalhadores escravos a importância na produção das suas narrativas de “encantamento” sobre as lendas de monstros enormes e fabulosos dentro e fora da cidade, como as “serpentes” que eram comumente associadas a alguns de seus senhores por maltratarem os mesmos e simbolicamente ganhava uma conotação imaginária de pessoas más que assumiam uma metamorfose de bichos assustadores e amaldiçoados.
A LENDA DA COBRA DO SÍTIO SÃO PAULO DE IPU
“...E, diante daquela enorme cobra que por sobre o talhado atravessava vertiginosamente as matas do Ipu deslizando calma e majestosa entre as pedras da deslumbrante cachoeira, via-se a grandiosa sombra animalesca. O chão tremia,o céu parecia escurecer, as mulheres rezavam, os homens escondiam-se, as crianças choravam. Os animais fugiam em enorme retirada...A cidade maldita estava condenada a cumprir o destino profético que tanto falavam os nossos antigos ancestrais africanos.O mostro adormecido acordava novamente...” (Petrônio Lima)
Diz a lenda, contada nos tempos da escravidão pelos velhos moradores da vila Nova do Ipu Grande , mais conhecida nos versos da cantiga de um antigo cantador de viola (negro Lourenço), que uma vez por ano a enorme Serpente descia da serra e ia beber nas margens do Ipuçaba. Tal mostro rastejador tinha como morada o Sitio São Paulo,um agradável sitio localizado por sobre a pequena vila onde lá funcionava um modesto engenho de propriedade da Dona Ana Ferreirra Passos.Uma velha senhora que segundo os antigos gostava de judiar e torturar seus poucos escravos que por lá trabalhavam vindo então em idade provecta a assumir a forma de uma enorme serpente.
Segundos depoimentos orais essa lenda foi musicalizada por negro Lourenço, umcantador de viola cantador era protegido pela família Martins e que sempre era motivado a cantar a lenda por motivos políticos. Tal lenda servira de propaganda pejorativa contra o grupo político e inimigo da época (os Porfírio), sendo que o mais envolvido nas querelas politicas era neto de D. Ana Ferreira.
Vejamos então alguns trechos da cantiga popular da Serpente do Sitio São Paulo de Ipu:
Tando eu cantando a cobra
No salão de seu Bolsão
Quando chega o seu Porfírio
Me dando voz de prisão.
Quando eu ia pra cadeia
Eu fui bem devagarim
E fui logo me valendo
Da mulher de seu Martim
Me vai-la dona Adelaide
Lhe peço por caridade
Venha soltar seu “neguim”
Quando sai da cadeia
“Divagarim” eu andei
E para dona Adelaide
Um “pade” nosso rezei
Foi logo depois das doze
Quando cheguei no “quatorze”
A mesma cobra cantei:
Ditado da cobra, le firo, le firo
O primeiro que eu como
É meu neto Porfírio!..
A cobra voava
Soltando assobio
Da quina da serra
Pra beira do rio...(Cantiga popular do Imaginário da Serpente Encantada do sitio São Paulo, Ipu)
O PENSAR CEARENSE NA DIMENSÃO CULTURAL DO CIRCULISMO CATÓLICO
Para finalizar o nosso mine curso abordaremos aqui algumas discussões rápidas e pertinentes a cerca das práticas culturais da experiência circulista dos trabalhadores católicos cearense tendo como fontes de pesquisa o trabalho desenvolvido em minha especialização sobre o Círculo Operário de Ipu, como também a referência do trabalho de Jovelina Santos, Círculos Operários no Ceará e o trabalho do historiador Carlos Augusto sobre a Militância Comunista em Camocim.
A ATUAÇÃO DOS CÍRCULOS OPERÁRIOS NO ESPAÇO DO TRABALHO
Os Círculos Operários no Ceará.
“...lembrem-se os ricos e patrões dos seus deveres; tratem os operários, cuja sorte está em jogo, dos seus interesses pelas vias legítimas; e, visto que só a religião é capaz de arrancar o mal pela raiz, lembrem-se todos que a primeira coisa a fazer é a restauração dos costumes cristãos...”
( Leão XIII-Incíclica Rerum Novarum)
As pesquisas realizadas sobre a organização circulista no Ceará ainda parecem refletir o pouco interesse sobre a experiência social dos trabalhadores católicos na região norte do Estado. Segundo Jovelina Santos os Círculos Operários, no Ceará, tiveram início com o trabalho pastoral de D. Manuel da Silva Gomes,terceiro bispo do Ceará, que assume suas funções em 1912 e já encontra o clero católico cearense sobre a orientação da reforma trindentina, com base nos fundamentos da Rerum Novarum. Sua efetivação prática só viria se concretizar em fevereiro de 1915, com a proposta de intensificar suas ações no combate às idéias contrárias aos princípios cristãos, principalmente quando estoura a Revolução Russa de 1917.
Diante deste contexto, a proposta circulista surge como peça fundamental na articulação com os sindicatos e alianças com as agremiações católicas em todo o Brasil, tendo o Ceará um destaque pioneiro nesse processo.
[...] o Ceará que se há colocado a vanguarda das boas iniciativas, pioneiro nas conquistas das causas justas e populares, teve a primazia entre os estados da Federação de ser o berço do circulismo. [...] Para assinalar as atividades circulistas de então, bastaria enumerar por exemplo a edificação de sua sede própria sede, à Praça Cristo Redentor, vindo após a instalação de escolas profissionais de sapataria, carpintaria, marmoaria, de alfabetização para menores e adultos,banda de música e cinema e ainda, um conjunto teatral.
Para Jovelina Santos, “nas décadas de dez e vinte os círculos operários ainda não haviam se projetado em outras regiões do país, enquanto que no Ceará essa organizações assumiam importância significativa, expandindo-se para as cidades interioranas”51, o que nos parece bastante alusivo sobre a presença do movimento dos trabalhadores católicos em áreas não industrializadas situadas na região norte da Ibiapabacomo em Ipu, ipueiras e Ibiapina
O CÍRCULO OPERÁRIO DE IPU E SUA DIMENSÃO CULTURAL
Poderia Exm Sr., dizer algo sobre Circulo Católico de Operário que se arregimentam e se organizam sob a orientação da Santa Egreja, que mãe carinhosa e solícita, zela para que os seus filhos não se enveredem pelos caminhos tortuosos e falsos da doutrina atheia e a moral de Moscou...O Círculo, apesar dos efeitos da sêcca de 1932,vai ressurgindo por entre as mais consoladoras esperanças.Retorna pouco a pouco a sua marcha.( Livro de Tombo da Igreja de Ipu. Ano de 1933.)
Desde as décadas de vinte e trinta no Ceará, uma grande parcela de trabalhadores e “operários” das pequenas cidades interioranas viriam assumir significativa importância na aliança com várias agremiações católicas. Dentre elas os Círculos Operários Católicos, já destacados anteriormente, é uma dessas agremiações da vanguarda anticomunista no interior da zona norte do Estado.
A formação moral dos trabalhadores passava por uma rígida e constante vigilância por parte do Clero Católico.A ameaça comunista pairava por sobre a cabeça da intelectualidade católica.Nesse sentido, educar os trabalhadores na luta diária contra o “perigo vermelho”consistia em fortalecer, através do Círculos Operários Católicos e demais entidades religiosas, a chama da cristandade e a preservação moral dos “bons costumes.”
“A dimensão cultural do circulismo cearense consistia em construir uma memória dominante nos espaços do cotidiano. Disciplinar,Moralizar e Instruir representava então o três pilares de formação educativa da cultura e prática católica do circulismo Ibiapabano.”( Artigo escrito em 2010 por Petronio Lima e postado no Blog Petrus Trekking: O Pesquisador Andarilho)
As narrativas e práticas culturais que formava o caráter do trabalhador cristão ipuense evidencia uma preocupação em formar os valores contrários ao materialismo anarquista e socialista nos espaços do trabalho por meio da instrução e a “boa leitura”. Partimos então do pressuposto da atual importância que O Círculo Operário possuía ou buscava possuir na vivência cotidiana da cidade por intermédio dos “agentes comerciais católicos” e suas práticas culturais e representativas no “combate a ociosidade” e “obrigação ao trabalho.”
Segundo Jovelina Santos, muito dos estudiosos afirmam os anos de 1932-1945 como um período de maior atuação do Circulo Operário no Brasil, tendo ano de 1932 a data célebre do pioneirismo circulista na cidade de pelotas no Rio Grande do Sul. Coincidência ou não, neste mesmo ano seria fundado em Ipu (1932) a formação de um “Círculo Operário” por Pe.Cauby Jardim Pontes,coadjutor do então padre Monsenhor Gonçalo de Oliveira. Natural da cidade de São Benedito, Pe Cauby era um sacerdote de punho firme e enérgico, conhecido por sua postura conservadora no combate ao comunismo ateu.
Pe. Cauby Pontes, que trabalhou comigo de 1942 a 1947, o qual, além de muitos outros benefícios, restaurou o Círculo de Operários, incentivou o catecismo e (ilegível) a cidade de uma amplificadora que, adquerido por subscrição popular,é propriedade parochial. .(Livro de Tombo da Igreja de Ipu. Ano de 1947.)
Padre Cauby Jardins Pontes.Fotografia do acervo do Prof. Francisco Mello de Ipu
A figura do Assistente Eclesiástico constituía um dos importantes fatores de mobilização e propaganda ideológica do circulismo. De fato , agia como um dos mecanismos de controle social da Igreja, tendo um papel decisivo e doutrinário na vida cotidiana do “operariado” cristão. “A dimensão cultural do circulismo cearense consistia em construir uma memória dominante nos espaços do cotidiano. Disciplinar, Moralizar e Instruir representava então o três pilares de formação educativa da cultura e prática católica do circulismo Ibiapabano.” (Artigo escrito em 2010 por Petronio Lima e postado no Blog Petrus Trekking: O Pesquisador Andarilho)
TRABALHOS ACADÊMICOS CONSULTADOS:
SANTOS, Carlos Augusto Pereira de. A militância comunista nos espaços do trabalho. Camocim-Ce (1927-1950). Dissertação de Mestrado defendida na Universidade Federal do Rio de Janiero. Fortaleza,2007.
SOARES, Agenor Júnior. “A Cidade Disciplinada:” A Igreja e os trabalhadores urbanos em Sobral (1920-1925). Dissertação de Mestrado defendida na Universidade de Pernambuco em 2002.
SILVA, Francisco Cleuton Pereira da. O Círculo Operário de Ibiapina. Igreja e Políticos contra o inimigo comum. (1942-1947). Monografia apresentada na graduação de História, pela Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA. Centro de Ciências Humanas, Sobral,2001.
BIBLIOGRAFIA
CHARTIER, Roger. A História Cultural: entre práticas e representações. Tradução Maria Manuela Galhardo. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1990.
BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico. Tradução Fernando Tomaz (português de Potugal) 8 edição. Rio de janeiro. Bertrand. Brasil,2005.
BURKE, Peter. História e teoria social; tradução Klauss Brandini Gerhardl, Roneide Venâncio Majer.- São Paulo: Editora UNESP,2002.
BOSI, Ecléa. Memória e sociedade: lembrança de velhos. São Paulo: Companhia das Letras,1994.
CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Lisboa: DIFEL,s/d.
CARDOSO, Ciro Flamarion e VAINFAS, Ronaldo (org.) Domínios da História. Rio de Janeiro: Campos,1997.
FARIAS, Damião Duque de. Em defesa da Ordem. Aspectos da Práxis Conservadora Católica no meio operário em São Paulo. (1930-1945). Editora HUCITEC. História Social, USP. São Paulo,1998.
FILHO, Alípio de Sousa. O poder das imagens: importância das metas, ritos e dos símbolos na política. In revista Odisséia, vl nov/fev.1994-1995,UFRN/CCHLA.
FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. São Paulo: Edições Loyola,1996.
___________: Vigiar e Punir. Trad. Lígia M. Pondé Vassalo. Petrópoles, Vozes, 1977.
GONÇALVES, Adelaide. Imprensa dos trabalhadores no Ceará: histórias e memórias. In: SOUZA, Simone. (org). Uma nova história do Ceará. Fortaleza: Fundação Demócrito Rocha, 2000,pp 259-286.
HOBSBAWN, Eric. Mundos do Trabalho: novos estudos sobre história operária. 2 ed,Rio de Janeiro: Paz e Terra,1988.
___________. A invenção das Tradições. Organizadores: Eric Hobsbawn e Terense Ranger. Tradução de Celina Cardim Cavalcant. 4 edição. Editora Paz e Terra.
LE GOFF, Jaques. História e memória. (5 ed). Tradução:Bernardo Leitão [et al]. Campinas-SP: Editora da UNICAMP,2003,544p.
MARIANI, Bethania. O PCB e a imprensa: os comunistas no imaginário dos jornais (1922-1989) / Rio de Janeiro: Revan; Campinas, SP.UNICAMP,1998.
MUNFORD, Lewis. A cidade na História: suas origens, transformações e perspectivas. Tradução: Niel R.da Silva. Martins fontes; São Paulo. 4 edição.1998.
NOCA, Francisco Wilson. Sermões, Matracas e Alcatrão: religiosos e comunistas na luta pelo poder. 1946-1950. Fortaleza: expressão Gráfica e Editora,1996.
RUBIM, Antonio Albino Carlos, BENTZ, Ione Maria. Narrativas e rituais enunciativos na imprensa: a intentona de 35.(orga.). Petrópoles, RJ: Vozes,1998.
SOUSA, Simone. Da “Revolução de 30 ao Estado Novo.” Uma Nova História do Ceará. Organização, Simone de Sousa. Adelaide Gonçalves. Ed. V. Rocha.
SANTOS, Carlos Augusto Pereira dos. Cidade Vermelha: a militância comunista em Camocim – Ce (1927-1950). Rio de Janeiro: UFRJ/IFCS.2000. Dissertação- Universidade Federal do Rio de Janeiro, IFCS.
SANTOS, Jovelina. Círculos Operários no Ceará: “instruindo, educando, orientando, moralizando” (1915-1963). Coleção Mundos do Trabalho.Fortaleza, Ceará,2007.
SÁ MOTTA, R.P.2002. Em guarda contra o perigo vermelho: o anticomunismo no Brasil (1917-1964). São Paulo. Perspectiva,2002.
THOMPSON, E.P. A Formação da Classe Operária Inglesa.. 3 vol. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra,1988.

Um comentário:

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